Nunca Pude Comemorar o Dia dos Pais
- Tiago Azeviche

- 19 de jun.
- 4 min de leitura
Atualizado: 11 de ago.

Por Tiago Azeviche
Descobri a necessidade paterna tardiamente, nunca tive coragem de cobrar pelo porquê dele não estar em nada além do nome do documento, se me perguntam o nome até esqueço só lembro do apelido, desde criança convivi com a ideia de aceitar essa coisa de não saber sobre meu pai, não lembro em que idade soube dele, mas lembro quando minha mãe contou a história na íntegra sobre quem era ele, a convivência familiar não me dava oportunidade de perguntar, houve diversas distrações, não fazia falta aparente e a capacidade de minha mãe em suprir esse buraco foi incrível até um tempo.
Na escola nessa semana (antes da final de semana do dia dos pais) vivia entre comparativos sobre força e da importância de profissões, todos eram os melhores homens do mundo e isso era o que se fazia importante para falar em público, no alfa e 1º série não falava nada, mas já na 2ª Série eu mentia, cheguei a dizer que meu pai era bancário que, na verdade, era o meu padrinho que morreu quando eu ainda era pequeno e mesclava ele ao pai dos meus primos que tinha o mesmo nome e por conta das características físicas achava vantajoso me “gabar” assim, fui criando uma figura paterna mítica para mim.
Sempre que falava sobre pai, eu saía pela tangente e um buraco gigante silencioso se abria. Lembro que na sexta tinha a festinha, eu sempre faltava aula sem precisar justificar, em casa minha mãe nem nos acordava.
Por questões religiosas, tive a oportunidade de escolher um Padrinho que fez seu papel Tio Vado fomos "parças" até a sua morte, mas esse é outro capítulo, ele passou estar cada dia mais próximo, nós tínhamos uma relação muito boa ele me dizia que eu era seu filho mais velho, ele marido da minha madrinha tínhamos uma relação de amor e amizade enorme, mas, no fundo sentia falta de um pai.
Aos 14/15 tive a oportunidade de jogar basquete e me fez estar em convivência direta com outras famílias, e nessa oportunidade pude ver pais de maneira presente com seus filhos desde os colegas, aos atletas adultos com seus filhos na arquibancada, até os próprios Pais de outro, havia um com o apelido de “Biscoito e o pai era chamado pela galera do time de Seu Broa”, daí nesse espaço pude notar quanto a falta da presença paterna me impactava e sobre essa importância, sentia falta de alguém na arquibancada, me apoiando, vindo e indo comigo com afinco, com uma sintonia de pai, eu não era dos melhores jogadores, mas com certeza para quem teve fez muita diferença.
Projetei em meu Padrinho Vado e tive boa resposta, em meus técnicos, em professores, em um chefe meu Sr. Júlio o único chefe negro em meu primeiro trabalho como menor aprendiz, até em vizinho, em irmão do terreiro que até chamei assim, projetei mesmo a figura de pai sem saber, eu era perdido nesse sentido, e com muitos rivalizei, me decepcionei, com alguns briguei, em todos vi pontos falhos e agradecia por não ter pai presente, não conseguia mais deixar alguém do sexo masculino exercer influência total sobre mim, fui um problema na infância e na adolescência.
E só compreendendo a importância através da espiritualidade e orixás do candomblé na minha vida que posso afirmar que foi meu alento nessa falta, aos 16 conheci o genitor que duvidou sua paternidade em minha cara, quando minha mãe me levou para conhecê-lo foi um dia triste a única vez que vi um avô meu e pude ouvir a voz dele, depois dessa só o vi quando tinha ódio em meu coração aos 19 no enterro de uma tia irmã dele, depois aos 21 e 25 o dia que vi ele assustado pela minha presença e com os olhos cheio de lágrimas por eu não ser agressivo lembro de ter pedido “a bença” e dito a ele de bate pronto que no final do dia eu iria embora, daí depois aos 27 que foi nossa mais longa e duradoura conversa que tivemos ele nos levou até Santiago, contou piada, sorriu e serviu comida, aquela foi a única vez que sorrimos um para o outro.
Antes de findar o desabafo, reafirmo aqui que fui indicado pela espiritualidade o caboclo mandou que fosse até ele e seis meses depois desse encontro ele faleceu, de lá para cá venho analisando com o avançar da vida o quanto essa não vivência impactou meu humor, minha cognição enquanto criança, todos os medos que não me fizeram avançar, e vários outros impactos que essa ausência me causou.
Eu poderia não mexer mais nisso, e mesmo fugindo disso na terapia, aprendi a falar sobre, o quanto minha criança sentia falta de comemorar o dia dos pais tentei chamar minha mãe de Pãe, mas não dá, resolvi aceitar o processo e abraçar minhas revoltas me faz hoje compreender que pude vencer e avançar sem mais me abater por essa falta, sou padrinho de várias crianças alguns hoje já adultos e sei que para executar essa função é importante presença de verdade.
Deixo aqui um relato de um homem que aos 30 trinta poucos anos resolveu reconhecer essa falta, que mesmo não deixando impactar confesso que foi muito pesado em alguns momentos, e memória das vivências provam a importância da figura paterna, agora pude superar e dribla todo e qualquer fantasma em torno disso.
Hoje, acho importante alertar que, se você tem filho, participe! Registre a criança, dê nome e suporte real, e veja como legalizar a pensão, quando você pega, mas além de tudo, seja o porto seguro, esteja do lado de fora do campo ou da quadra, seu papel é fundamental.
Nos últimos cinco anos aprendi a interpretar essa dor e mesmo sobrevivendo, só aqui entendi que nunca tinha festejado o dia dos pais me faltava entendimento dessa falta, que com certeza seria sanada se meu pai fosse uma vez em minha direção, festejo hoje a minha resiliência e cada superação que tenho com essa falta em silêncio que sano essa dor falando aqui, perdoe seu pai e seja presente para seu filho.



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